Militares contra
os imigrantes
O governador do Texas, Rick Perry,
anunciou o desdobramento de mil efetivos da Guarda
Nacional na fronteira com o México, a partir do
próximo mês (agosto n,r), a fim de conter o fluxo de
imigrantes indocumentados, em meio de um reinício
inédito da chegada de menores mexicanos e
centro-americanos que se internam sozinhos e sem os
documentos correspondentes no território
estadunidense.
O mandatário estadual, que aspira à
candidatura presidencial do Partido Republicano para
as eleições de 2016, negou que a referida medida
signifique a militarização da linha na fronteira com
o México. Por seu lado, o chefe administrativo
militar do Texas, John Nichols, disse que suas
tropas só se encarregarão de dissuadir os imigrantes.
Se bem é certo que a Guarda Nacional
é um corpo formado por voluntários e sob o comando
dos governadores dos estados, trata-se, a fim de
contas, de um organismo militar, munido de meios
castrenses marítimos, terrestres e aéreos, várias de
cujas unidades foram enviadas a guerras como a do
Iraque. Uma das diferenças significativas entre esta
agrupação e os outros ramos das forças armadas –
exército, marinha ou força aérea – assenta em que as
segundas têm proibido usar armas para fazer
respeitar a lei no território estadunidense,
entretanto a Guarda Nacional dispõe de autorização
para disparar dentro do país. Pelo anterior, seria
um excesso de candidez acreditar na afirmação de que
os efetivos desdobrados estarão limitados a
dissuadir imigrantes indocumentados, e resulta
condenável que o governo texano pretenda minimizar o
alcance de sua própria decisão e esconder aos olhos
da opinião pública a gravidade de uma medida que
implica, simplesmente, a militarização da fronteira.
Ao contrário, a determinação de
Perry é um novo aperto na política de criminalização
e perseguição de imigrantes por parte das
autoridades do vizinho país: a partir do
desdobramento da Guarda Nacional, aqueles que
cruzarem a fronteira texana, procurando uma vida
melhor deverão fazer frente não só aos perigos de um
entorno natural inclemente, aos traficantes de
pessoas, aos abusos das corporações policiais de um
e outro lados da linha de demarcação e ao sadismo de
grupos civis racistas dedicados à caça humana: agora
terão que enfrentar também forças militares
treinadas para a guerra e para a aniquilação física
do adversário. Longe de atenuar a dramática situação
que enfrentam cotidianamente milhares de imigrantes
indocumentados, esta se tornará mais incerta e
perigosa.
Sem desconhecer que a determinação
referida faz parte do uso político que os
republicanos têm feito do tema migratório para
golpear o governo de Barack Obama, e que o próprio
Perry tem dado sinais de atitudes xenófobas e
intolerantes, não se pode deixar de ter em conta que
a responsabilidade principal pela circunstância que
padecem os imigrantes – particularmente as crianças
– no vizinho país cabe ao mandatário estadunidense.
Afinal de contas, faltando pouco mais de dois anos
para que conclua seu segundo período presidencial,
Obama não pôde cumprir um de seus principais
oferecimentos da campanha: una reforma migratória;
não fez nada para atenuar os maus-tratos e a
perseguição que padecem os cidadãos indocumentados
nesse território e, pelo contrário, se agravaram
essas tendências e deportou a mais imigrantes que
nenhum outro presidente estadunidense.
A chamada crise humana em que se tem
convertido o fenômeno migratorio nos Estados Unidos
não seria tal se a classe política de Washington,
começando por seu próprio presidente, assumisse de
vez que não há solução mais sensata, construtiva e
congruente que despojar a imigração do seu caráter
criminal. Hoje, contudo, e para todo efeito prático,
este fenômeno continua sendo colocado por
autoridades desse país no âmbito das ameaças
militares, na contramão da lógica e dos princípios
humanitários mais elementares. (Reproduzido de La
Jornada)