Greve geral no Paraguai, uma contagem
ao governo paraguaio
Juan Manuel Karg
AS
sete centrais sindicais paraguaias convocaram a uma
greve geral em massa, em 26 de março. Tratou-se da
primeira parada dessas dimensões, nos últimos 20
anos, com um alto acatamento por parte dos
trabalhadores paraguaios. As reivindicações? Um
aumento de 25% nos salários; controle de preços da
cesta familiar; não à alta do pagamento do
transporte público; e o repúdio à polêmica Aliança
Público-Privada (APP) sancionada recentemente. Em
definitiva, a exigência de uma mudança de política
econômica por parte do governo conservador do
empresário Horacio Cartes.
A
bem-sucedida greve geral dos trabalhadores se dá num
contexto de avanço duma política econômica
concentrada (de corte neoliberal) e excludente para
as grandes maiorias, por parte do governo paraguaio.
O significado da APP não dá lugar a várias
interpretações, senão que efetivamente significa uma
sensível perda de autonomia governamental em relação
à infraestrutura pública, em benefício do setor
privado. O texto afirma que o Executivo poderá
impulsionar tais alianças por licitação e outros
mecanismos que não se especificam. Para o
conservador jornal La Nación, do Paraguai, um
dos objetivos da norma é que o setor privado
“recupere seu investimento com a exploração do
serviço que presta tal obra, por exemplo, construção
de estradas e pontes para o serviço de trânsito ou
comunicação terrestre”. O que é que se procura, de
acordo a esta explicação? Em poucas palavras: trazer
capitais privados, para depois fazer concessões a
partir da gestão e a cobrança de tarifas das obras
realizadas.
Em
fevereiro passado, o FMI qualificou a APP como “um
instrumento importante para o investimento em
infraestrutura do país”, tal como afirmou o
vice-diretor gerente desse organismo, Naoyuki
Shinohara, em visita oficial a Assunção. No interior
do país, uma das figuras principais de defesa da
Aliança Público-Privada foi, nada mais nada menos,
que Germán Ruiz, titular da Associação Rural do
Paraguai, que inclusive se permitiu dizer que “os
que criticam a APP são antipatriotas”. Este
ex-abrupto mostra a defesa corporativa que alguns
setores do poder econômico paraguaio fazem da nova
normativa, que garantirá os máximos benefícios para
o âmbito privado.
Contra a normativa se pronunciou, em primeiro lugar,
a Plenária de Centrais Sindicais, convocando a esta
greve geral desde fim de 2013 — após a sanção
oficial da APP. Também aderiram à convocatória a
Coordenadora Democrática e a Federação Nacional
Camponesa. Pode dizer-se, portanto, que um amplo
espectro de organizações sociais, sindicais e
políticas conseguiram confluir numa jornada de greve
geral e mobilização bem-sucedida, com sensíveis
reivindicações, como um aumento salarial de 25%, o
estabelecimento de um controle de preços para os
produtos da cesta básica, um repúdio ao incremento
das tarifas no transporte público e o repúdio à APP.
Sem
dúvida, o sucesso da jornada abriu fendas nos passos
a seguir no seio do próprio governo paraguaio. O
vice-presidente do país, Juan Afara, manifestou que
“o governo cometeu um erro durante a criação da Lei
de Aliança Público-Privada. Não socializamos com
todos os setores, mas convidamos a que a cidadania
leia a normativa e esteja informada”, após o qual
anunciou a conformação duma “mesa de diálogo” com
representantes sociais, políticos e econômicos.
Esta
mesma autocrítica pode significar um primeiro passo
para promover, não apenas a discussão da lei, mas
também o modelo econômico que leva para a frente o
governo de Cartes — da qual esta legislação é mais
um ponto, ainda que claro, com uma transcendência
inegável. É que, numa altura em que na América
Latina se discute, em geral, maior participação
estatal nos assuntos econômicos cotidianos, produto
da irrupção de governos pós-neoliberais em boa parte
de nossos países, debates como os que se dão no
Paraguai faz com que lembremos outras décadas, de
resistência face aos avanços do grande capital
concentrado.
O
desafio para as organizações sociais e políticas do
Paraguai será continuar expondo, tanto nas ruas
quanto nos âmbitos institucionais, suas justas
demandas sobre estes temas, para evitar recuos em
matéria de conquistas sociais e direitos.
Aparentemente, a participação popular em massa na
jornada de greve geral e mobilização é uma notícia
saudável, da qual o governo deverá tomar rápida
nota. (Extraído do Rebelión)
• O
secretário da Central Nacional dos Trabalhadores do
Paraguai, Juan Torales, assegurou que conseguiram
90% de acatamento da greve.
Outros reclamos dos grevistas foram:
-
Pela
reforma agrária e o respeito à vida no campo.
-
Pela
saúde e pela educação gratuita e de qualidade.
-
Pelo
respeito aos direitos humanos e sindicais.
-
Liberdade para os 12 camponeses presos políticos de
Curuguaty. A chacina de Curuguaty, acontecida em 15
de junho de 2012, significou a morte de 11
camponeses e seis policiais. Este fato foi utilizado
para justificar o Golpe de Estado parlamentar
disfarçado de julgamento político (impeachment), que
afastou de seu cargo Fernando Lugo, presidente
constitucional do país.
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