Abutres atacam
para descarnar a Argentina
Joaquin Rivery
Tur
OS denominados fundos abutres dos
Estados Unidos atacam como aves de rapina para
alimentar-se dos esforços da Argentina por sair
adiante em suas dificuldades financeiras.
O problema data de vários anos,
quando em 2001 estalou a crise econômica que
terminou numa rebelião popular, controlada somente
quando o presidente Néstor Kirchner conseguiu adiar
a dívida externa do país (operação que se repetiu
duas vezes e foi aceitada por 93% dos credores), mas
com a negativa de alguns poucos que adquiriram bônus
de empresas e bônus soberanos estatais, cujo valor
real chegou a estar em 20% de seu valor nominal no
chamado mercado secundário.
Este pequeno grupo, depois de
adquirir os documentos de dívida por preços
irrisórios, apresentaram-se depois ante o tribunal
do juiz Thomas Griesa, no distrito sul de Nova York,
para reclamar que os argentinos lhe pagassem o
montante nominal total dos débitos por eles
adquiridos. O que exigem representaria que Buenos
Aires deveria pagar nada menos que o 1.600 % do que
os abutres pagaram pela dívida, isto é, o país sul-americano
estaria quase na bancarrota de aceitar essas
condições.
O juiz Griesa, segundo parece
vinculado à manobra para pôr a Argentina contra a
parede, nomeou um intermediário para que os fundos
abutres negociaram com o governo de Cristina
Fernández, mas sem resultado, pois o que buscavam
era que o governo sul-americano caísse em situação
de mora financeira (default), o que
significaria uma crise sem precedentes para sua
economia e uma inflação disparada pela
desvalorização.
Realmente, a Argentina pagou a 93%
de seus credores, mas Griesa congelou o cancelamento
até que se amortizasse o devido ao total dos
possuidores de bônus de dívida. Com esta decisão, o
juiz obriga Buenos Aires a não pagar a seus
credores, apesar de que já transferiu a dois bancos
norte-americanos o montante reestruturado de sua
dívida, de onde resulta uma espécie de mora ou
default seletivo.
A decisão do juiz é ilegal, pois a
legislação de Nova York, jurisdição onde se analisa
o caso, estabelece que é ilegal comprar dívida com a
intenção e o propósito de litigar contra ela.
Griesa parece não conhecer bem as
leis de seu próprio estado, deixando entrever um
conluio judicial para evadir esta norma.
A presidenta da Argentina, Cristina
Fernández de Kirchner, por ocasião de uma disputa
com um fundo abutre que terminou com o seqüestro da
fragata Liberdade num porto estrangeiro, afirmou que
"os abutres são as aves que começam a voar sobre os
mortos; os fundos abutres sobrevoam sobre países
endividados e em default. São depredadores
sociais globais".
Resulta curioso que o mesmo Banco
Mundial (BM) estima que mais dum terço dos países
que têm cumprido os requisitos de seus respectivos
programas de reestruturação da dívida soberana
tenham sido alvo de pelo menos 26 fundos
financeiros.
O prêmio Nobel de Economia, Joseph
Stiglitz, declarou ao The New York Times:
"Temos tido muitas bombas ao redor do mundo, e esta
é uma que os Estados Unidos lhe lançam a todo o
sistema econômico global".
O ministro da Fazenda do Brasil,
Guido Mantega, apoiou a tese do governo argentino:
"Não creio que a Argentina esteja num default,
pois está pagando sua dívida, pagou a seus credores
e pagou ao Clube de Paris. Enfrenta uma situação
excepcional, pois quem lhe impede pagar é um juiz
estadunidense".
O BM ratificou que os fundos abutres
conseguiram cobrar até US$1 bilhão em dívidas
soberanas e lhe reclamam a Argentina US$1,3 bilhão,
o que representaria uma catástrofe para o país, e
que a bomba norte-americana pode causar um dano
terrível à reestruturação das dívidas dos países
desenvolvidos que devem recorrer proximamente a este
mecanismo. A decisão de Griesa pode significar mais
fome para o mundo pobre.
O governo argentino expressou que se
apresentará ante a Corte Internacional de Justiça da
Haia para reclamar pela sentença do juiz Griesa.
O secretário-geral da presidência,
Oscar Parrilla, anunciou que a Argentina estará
presente em "todos os cenários internacionais"
possíveis para denunciar estas ações dos fundos
abutres, aos que qualificou como a "sarna do
capitalismo mundial". "A Argentina vai recorrer a
todas as ações legais e políticas no âmbito dos
organismos internacionais, quer seja o tribunal da
Haia, o G-20, quer as Nações Unidas".
O país de San Martín está decidido,
com o apoio do Grupo dos 77, do Mercosul, da ALBA,
da Unasul e dos Não-Alinhados, a denunciar e
demonstrar esta absoluta barbaridade dos fundos
abutres que já têm espoliado vários povos com sua
prática especulativa.