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24º FESTIVAL INTERNACIONAL DE BALÉ DE HAVANA
Sob o feitiço
de Alicia Alonso
Mireya
Castañeda
A emoção foi
indescritível. Alicia Alonso, essa grande dama do
balé universal, voltou ao palco sorridente e
satisfeita. Ela, gênio e mito da dança universal,
encerrou o tradicional desfile da Gala de
inauguração, desta vez no teatro Karl Marx, um
verdadeiro coliseu havanense.
Desde os
começos destes festivais, em 1960, a Gala de
abertura, em 28 de outubro, rememora, em uma sorte
de apoteose, a criação, em 1948, do Ballet Alicia
Alonso, hoje tornado Ballet Nacional de Cuba (BNC).
Na inauguração
marcaram presença o primeiro vice-presidente dos
Conselhos de Estado e de Ministros Miguel Díaz-Canel;
o presidente da União dos Escritores e Artistas de
Cuba, Miguel Barnet; a diretora da Escola Nacional
de Balé, Ramona de Saa, e figuras de vulto da
companhia cubana, como os primeiros bailarinos
Aurora Bosch, Marta García, Maria Elena Llorente,
Orlando Salgado e Lázaro Carreño.
O Festival
Internacional de Balé de Havana já tem seu avoengo
e, nesta ocasião, sua presidenta convocou o mundo da
dança a ver seu presente e avistar o futuro, sem
abrir mão da memória.
Com o poderio
de sua lenda atraiu à Ilha estrelas e companhias de
bailado de uns vinte países, os quais mostraram o
melhor do seu desempenho na dança, até o dia 7 de
novembro.
Uma reverência
da prima ballerina assoluta selou um desfile
sempre empolgante, pois entraram no palco desde os
dançarinos mirins da Cátedra do Ballet Nacional, os
estudantes da Escola Nacional de Balé, até o elenco
todo da companhia, com suas primeiras figuras.
O 24º Festival
de Balé de Havana é dedicado ao 450º aniversário
natalício de William Shakespeare e por isso as
cortinas se abriram para mostrar uma coreografia da
própria Alicia Alonso, inspirada em Romeu e Julieta,
e que ela intitulou Shakespeare e suas máscaras.
A obra, com
arranjos orquestrais de Juan Piñera e roteiro de
José Ramón Neyra, teve como personagens principais,
interpretando Romeu e Julieta, duas figuras
principais da companhia: Anette Delgado e Dani
Hernández.
Na sua condição
de diretora-geral do BNC Alicia Alonso também
mostrou interesse especial em cultivar a arte
coreográfica. A excelsa bailarina já deu de presente
ao mundo da dança sua versão de várias peças
clássicas: Giselle, O lago dos cisnes, A Bela
Adormecida, Dom Quixote, Coppelia), com seu
apego à tradição, mas despojada do supérfluo e
compreensível para o público atual.
Giselle,
o balé romântico por excelência, O Lago dos
Cisnes e A Bela Adormecida incluem-se,
isso não poderia ser entendido de outra maneira, no
programa do Festival. A pegada de Alicia Alonso
aparece também em inúmeras obras recentes, mas
apenas daria para mencionar as que terão sua reprise
no Festival: A magia da dança e Tula,
esta última dedicada ao bicentenário natalício da
poetisa Gertrudis Gómez de Avellaneda.
O autor do
roteiro deste bailado, José Ramón Neyra, comentou à
jornalista que os espectadores que assistiram a sua
estreia, em 1998, "vão perceber uma diferença no
final da obra e é que Alicia Alonso acrescentou uma
variação para Tula antes da cena final, que se
alguém lembra, acontece no Teatro Tacón, quando
Avellaneda é coroada com louros por Luisa Pérez de
Zambrana, outra grande poetisa cubana".
Neyra
acrescentou que "felizmente para os artistas que têm
que representá-la, nesta ocasião Alicia encarregou
Svetlana Ballester, quem fez a estreia, para que
fosse a responsável pela reprise. A primeira
bailarina Amaya Rodríguez desempenhará o papel de
Tula".
Quando da
estreia, Alicia Alonso comentou: "Como vocês sabem,
meus olhos são fracos, mas vejo tudo na minha
mente". Nesse sentido, Neyra conversou com Alicia,
pediu-lhe os roteiros de Tula e também de
Shakespeare e suas máscaras.
"Alicia não
manda fazer uma coisa e deixa tudo ao acaso. Alicia
encomenda e confere, revê, discute imenso como
diretora que é, não só com o roteirista, mas também
com o designer do vestuário, com o da cenografia, e
a discussão chega até o momento da montagem no
salão, com as primeiras figuras que vão interpretar
o balé".
A mítica
bailarina é uma pessoa extraordinária. Uma artista
genial consagrada à dança, no sentido mais amplo.
Coreógrafa notável, capaz de recriar o melhor legado
clássico, renovando-o, enriquecendo-o e combinando-o
com elementos novos e, como bailarina excecional,
com seus arabesques únicos, seus balanços,
seus intrépidos fuetes, seu por de brás,
sua leveza, com isso tem sido Giselle, Odette-Odile,
Taglioni, Carmen, Dido, a princesa Aurora, até
desempenhar mais de uma centena de papéis em seu
vasto repertório.
Ainda mais. Eis
sua cátedra de grande professora, capaz de gerar um
estilo reconhecido como Escola Cubana de Balé, que
alicerça em uma técnica suprema e um virtuosismo
difícil de superar, que legou ao mundo figuras de
destaque, desde As Quatro Jóias, até bailarinos de
estirpe mundial, como José Manuel Carreño e Carlos
Acosta.
Alicia Alonso é
uma estrela indiscutível na galáxia do balé mundial.
Em uma de suas múltiplas entrevistas disse: "Quando
comecei a dançar não pensava ser uma estrela. O que
eu queria era dançar e dançar bem. Toda minha vida
dancei porque gosto disso, não para ser uma grande
estrela".
Eis a grandeza
de uma prima ballerina assoluta que provoca
uma ovação de mais de cinco mil espectadores quando,
com seus 93 anos, encerrou o desfile da Gala de
inauguração.
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