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Só TEXTO / Assinatura jornal impreso

C U L T U R A

Havana. 20 de Março, de 2014

Suíte para Frank Fernández

Daniel González Rodríguez e Osmerys Ramos Méndez

EM 16 de março fez anos um dos pianistas cubanos mais importantes. Ele sabe tocar o piano como poucos, segundo a crítica especializada e o público que o aclama. Intérprete ideal, monstro musical e gênio pianístico foram alguns dos apelativos deste cubano, que conquistou nas últimas décadas do século passado os palcos de mais de 35 países. Com 70 anos e uma ampla discografia, cerca de 150 fonogramas, Frank Fernández dispõe-se a comemorar neste ano seu 55o aniversário de vida artística.

Como o senhor chegou ao piano?

“Eu não cheguei ao piano, ele chegou a mim. Porque antes de ter consciência, segundo me contaram, comecei a tocar, entre os 3 ou 4 anos, de ouvido e sem receber informação teórica. Aos 5 anos minha mãe, que tinha uma academia na casa, começou a dar-me aulas”.

O que significa para o senhor sua mãe?

“Lamentavelmente, ela morreu quando eu completei seis anos. Cada vez que penso nela a vejo numa espécie de nebulosa. Durante muitos anos eu estive pensando que era a maior solidão de minha vida, ao não ter a compreensão, a proximidade, o contato físico do amor de uma mãe. Mas dalguma maneira foi minha luz, meu farol, meu guia”.

“Quando ela estava morrendo, na usina açucareira chamada Preston na época, e agora com o nome de Guatemala, levaram-me a seu leito no hospital e ela disse: ‘filho, não abandone nunca o piano, você tem talento’”.

Para Frank Fernández, o que é a música?

“Acho que é algo sem o qual eu não poderia viver. Um dia imaginei um país, um mundo sem música e fui transladando-me, cheguei ao chamado silêncio absoluto do cosmos, senti como uma vertigem. Creio, e pelo menos para os seres como eu, que não sou dos poucos, que a música é como a água, como o oxigênio, como o sangue, como a vista, como o olfato; é um sentido, é muito mais do que um fato físico material. A música é uma linguagem com leis próprias, capaz de transmitir o que nenhum idioma pode fazer”.

Mayarí sempre aparece em toda conversa sobre as origens de Frank. Como lembra aquela infância em Mayarí?

“Na minha casa primava o conhecimento dos grandes clássicos universais e na de Martín Meléndez, diretor da Banda Municipal e grande amigo da família, eram os nacionais. Para mim, tão jovem naquela época, a única diferença era que os nomes em casa eram um pouco difíceis. Onde morava Martín eram María Teresa Vera, Sindo Garay, Manuel Corona, Miguel Matamoros, Benny Moré; em minha casa eram Wolfang, Ludwing, Robert, Wagner, Brahms, Beethoven. Para aquela criança, nenhuma classe de música era melhor do que a outra. E isso chegou a mim de uma maneira natural, espontânea, sem imposição. Precisamente, essa espontaneidade sem adoçantes intelectuais, unida ao ambiente cultural de Mayarí, constituem os pilares fundamentais na minha formação musical”.

Como lembra Frank sua entrada ao teatro Amadeo Roldán?

“Evidentemente eu tinha nascido músico ou, pelo menos, com grande preferência pela música, e nessa busca da felicidade fui ao teatro Amadeo Roldán. Naquele momento, era o Conservatório Municipal de Havana e a máxima escola de música do país. Quando cheguei, disseram-me que não tinha suficiente desenvolvimento técnico-profissional para entrar. Aquela negativa foi um copo de água fria. Não podia estudar comércio, como queria meu pai, porque eu não gostava disso; não podia estudar para ser concertista, porque não me admitiam. Fui trabalhar no que me aceitaram: pianista de centros noturnos. Estive um ano e meio trabalhando, ganhei muito dinheiro”.

“Depois, fui à Suprema Corte da Arte, um programa de artistas amadores dirigido por José Antonio Alonso. Isolina Carrillo, a compositora de Duas Gardênias, determinava se o artista não era aprovado, com um toque do sino. E eu passei, não tocaram o sino. A partir daquele momento consegui melhores empregos e consegui fazer um último trabalho no restaurante Monseigneur que realmente se converteu em outro pilar. Mais do que um meio de vida, foi uma escola, não somente por permitir-me conhecer Sindo Garay, Manuel Corona, Miguel Matamoros ou Mozart, Beethoven, Liszt. Era acompanhar a canção sem o recurso duma partitura e que o cantor, às vezes, dissesse que estava rouco ou que eu subisse o tom — assim chamam os músicos ao sistema de notação que lhes é confortável a uma voz. Se muda o tom, mudam também todos os acidentes do teclado e as notas pretas tocam em brancas. Tais situações eram muito frequentes e isso não se estuda em nenhuma escola, isso se obtém na escola da rua”.

“Não sei com que instinto reagi, mas abri mão de tudo aquilo e fui para Mayarí, dirigir um coro de amadores. Todos disseram que eu estava louco. Estive movimentando-me muito no ambiente cultural de Santiago de Cuba e soube que havia um curso de direção coral. Como já tinha formado um coro de amadores, decidi arriscar-me. Não me admitiram como aluno regular porque eram os grandes diretores de coro os que vinham. Fui aceito como aluno auxiliar, não era dos principais alunos, com certeza, mas eu me esforcei muito… Cada vez que a turma abandonava a sala de aulas, eu me sentava ao piano e começava a tocar as obras que dirigiam os alunos de direção. Ao finalizar o curso, o professor alemão Henri Mosser, apontou suas referências acerca de mim: “Frank Fernández pode ser um grande diretor de coro, mas melhor pianista”. Agradeço muito o que ele disse. Imediatamente as portas do Conservatório abriram para mim, fui nomeado professor aluno e converti-me no ajudante de direção coral de Manuel Ochoa, que era diretor da escola coral do Conservatório e de vários coros importantes do país”.

Como chegou a Moscou e se converteu no primeiro pianista cubano que estuda e termina com ¨Summa cum laude¨, no Conservatório Tchaikovsky?

“Após o triunfo da Revolução, fui o primeiro cubano que chegou ao Conservatório, por um concurso de oposição. E consegui essa chegada graças a Margot Rojas, uma importante e eminente pedagoga. Estudei seis anos com ela no Conservatório e preparou-me para o Concurso Uneac, o primeiro que se fez aqui. Mas havia uma dificuldade enorme: eu não tinha piano”.

“Durante seis anos morei numa pensão. Três meses antes do concurso pude alugar um piano, mas aí foi pior porque nesses lugares quase sempre os inquilinos têm horários de trabalho diferentes. Contudo, com grande tolerância e algumas brigas, esses três meses me ajudaram muito nos últimos dias. Isso foi o que me permitiu ganhar o primeiro prêmio, além de um pouco de talento e muito sacrifício. Também influiu a ajuda de Margot Rojas e que Isaac Nicola não me pus sanções, pois eu irrompia nas salas de aulas para estudar, porque naquele tempo isso estava proibido. Esperava que as professoras fossem ao banheiro e entrava às escondidas, faltava um aluno e aí estava eu. Assim cheguei a Moscou”.

“Muitos especialistas asseguram que Frank Fernández criou em Cuba a escola contemporânea de piano, com o melhor dos clássicos nacionais e, ao mesmo tempo, enriqueceu-o com experiências de culturas como a russa e a europeia. Quais foram os desafios para a criação da própria identidade cubana?

“A escola pianística começou em Cuba com Ignacio Cervantes no século 19. Haviam excelentes pianistas e conseguiram-se muitos reconhecimentos, mas os que existíamos como premiados internacionais naquele momento, todos nós tínhamos estudado nos Estados Unidos ou na Europa. Muitos asseguravam que não éramos capazes de ganhar um concurso internacional porque nosso ambiente cultural estava muito afastado daqueles países que os convocavam: Moscou (Rússia), Paris (França), Bélgica. No meio desse mundo de dúvidas, de falta de auto-estima perante a colonização cultural, porque somos meio índios e para tirar-nos a tanga temos que tirá-la em Paris, Madri ou Moscou, empenhei-me.  Comecei a transmitir meus conhecimentos aos alunos; deles saiu Jorge Luis Prats, depois de trabalhar seis anos comigo; Víctor Rodríguez, o primeiro cubano laureado em Moscou; Leonel Morales, que acabo de vê-lo com mais de 14 prêmios internacionais; sai no piano acompanhante Elisa Pedroso, e outros casos que não são laureados internacionais, mas têm um grande desempenho artístico. Depois disso, muitos professores e pessoas que não acreditavam o suficiente na possibilidade de trabalhar a partir de Cuba, conseguiram sucessos internacionais. É aí onde, em primeiro lugar, os russos usam o qualificativo como um reconhecimento que eu agradeço muito. Contudo, a escola de piano cubana não pertence a Frank Fernández, é de muitas pessoas”.

Como vê o futuro da escola de piano em Cuba?

“Acho que vai continuar fortalecendo-se, independentemente de que estamos passando por momentoS difíceis e de que nossa economia prejudica muito as entradas de talentos. Temos que ir dosificando isso porque muita gente emigra por necessidades econômicas. Ainda assim, o piano em Cuba vai continuar para a frente, porque há uma escola jovem, mas florescente. E quando se escuta um pianista cubano em qualquer lugar do mundo tem umas características tão particulares que, embora seja muito difícil de explicar, sabe-se que é Cuba quem está tocando”.

Sua vida artística chega ao 55o aniversário neste 2014, de que  sente mais orgulho Frank Fernández no plano profissional?

“O que mais orgulho me faz sentir é que ainda coro perante uma nova obra. Ainda me empolgo, como o primeiro dia, ao trabalhar de conjunto ou ensinar aos jovens as experiências musicais que penso, posso ensinar-lhes. E uma das coisas mais belas que está acontecendo é que decidi fazer um concerto na abertura do Festival de Música de Câmara, no dia 25 de março, evento que, também me dedicaram neste ano”.

“Agora estou trabalhando em A Truta, o quinteto mais belo que escreveu Schubert e um dos mais lindos de toda a produção musical. Acompanham-me quatro jovens músicos: uma de Camagüey, um de Guantánamo e dois de Holguín. Cada vez que vem um ensaio, para mim é como se fosse uma festa. Disso é do que mais me orgulho: de não ter perdido a possibilidade de surpreender-me. Que não desapareceu em mim a criança que buscava o rio para sentir-se livre, que ainda tenho a ilusão de que o mundo pode ser melhor e, sobretudo, eu. Que posso ajudar com meu trabalho, com meu humilde, mas profundo trabalho como fazedor de sons e silêncios, para fazer da música algo melhor”.

Um Momento…Somente Frank

O ano 2014 é para Frank Fernández, na opinião dele, um ano importante. Além das datas significativas para sua carreira, o Maestro da escola contemporânea de piano em Cuba tem muitos sucessos acumulados. Um deles, e para ele o mais importante, é o reconhecimento de seu povo. Por esta razão lançamos a convocatória através das redes sociais e correio eletrônico a que nos envie suas opiniões e comentários acerca da música de Frank. Com respostas simples a perguntas tão básicas como: Quanto o marcou a música de Frank? Que sente escutando o maestro tocar o piano? De qual de suas obras vocês gosta mais? Desta forma colaboraria enormemente na realização do documentário “Somente Frank”.

 

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