Schola Cantorum
Coralina no
Festival Leo Brouwer
Mireya
Castañeda
A maestrina Alina Orraca é figura
essencial na história do âmbito coral cubano. De
estatura pequena, porém imensa no pódio, sempre com
um sorriso que reflete satisfação e plenitude
intensas.
Graças a ela, há 20 anos, Havana
também tem sua Schola Cantorum, com o sobrenome de
Coralina. Um coro de excelência que distingue por
sua perícia técnica na interpretação e a paixão de
seu canto.
Num diálogo com Alina, nesta vez por
ocasião do 6º Festival Leo Brouwer de Música de
Câmara (26 de setembro-12 de outubro) revisitamos
alguns tópicos para concentrar-nos em sua
participação no grande evento.
Sem dúvida, no início o nome
resultou diferente, e até difícil para alguns...
"Eu quis nomeá-lo Schola Cantorum
porque esse é o nome de uma instituição que existe
desde o século quarto. Na Europa, associadas às
catedrais, foram criadas escolas de canto e
respiração para que as crianças, naquele momento os
meninos, aprendessem a cantar para os coros. O
projeto era para ensinar as crianças a cantar, daí o
nome de schola cantorum".
"Atualmente, existe em muitos
países, por exemplo na Espanha há nove, e no México
há uma muito famosa, também em Caracas. Em Cuba
jamais houve uma schola cantorum, por isso foi que
pensei nisso, isto é, uma escola de canto, pois é,
devia ter um sobrenome. Comecei a procurar, se
Havana, se Cuba, mas me parecia que não me
pertencia. Eu dirigi o coro de câmara da Escola
Nacional da Arte (ENA), desde 1979. As pessoas
sempre o chamaram o coro de Alina, então misturei as
palavras coro e Alina, daí, Coralina. É verdade que
no início muitas pessoas o achavam um pouco estranho
mas rapidamente ganhou força e isso me alegrou
muito".
Falemos então do repertório, das
linhas de trabalho.
"Nós fazemos todo tipo de
repertório, interpretamos música sacra, música
contemporânea, popular, cubana e de outros países,
nomeadamente latino-americana. São as linhas que
mais gostamos trabalhar, sem deixar de fazer música
barroca, romântica, clássica".
"Trabalhamos por projetos. Há alguns
anos, fizemos um projeto de música antiga com o
maestro catalão Josep Cabré, junto ao grupo Ars
Longa, também fizemos outro projeto com música de
Franz Schubert, por ocasião de seu 200º
aniversário".
"Durante estes anos, Coralina se
juntou a diversos projetos e espaços com agrupações
de prestígio, cujos nomes já se inscrevem no melhor
da música de concerto em Cuba: o coro Exaudi, o
conjunto de música antiga Ars Longa, e a Camerata
Romeu. Em 2005, numa ocasião memorável, as quatro
agrupações ofereceram vários concertos interpretando
o Magnificat de Bach, sob a regência de Zenaida
Romeu".
Agora, a Schola Cantorum Coralina
volta a compartilhar o palco, a pedido do próprio
maestro Leo Brouwer.
"Realmente é uma grande honra que o
maestro Leo nos convocasse para participar dum
festival de música de câmara que, mais do que isso,
é um Festival das artes cubana e internacional. Além
de sua experiência como músico, de sua inteligência
e cultura, ele tem o bom senso de encontrar a
magnitude dos artistas no mundo. É uma pessoa que
conhece de literatura, das artes plásticas, conhece
de tudo, então sabe integrar uma coisa com outra. Eu
acho que este Festival é mais do que uma festa, uma
demonstração de cultura geral".
Quais as obras que apresentarão?
"Estou muito contente porque tive
que desempoeirar algumas partituras que há muito
tempo não interpretamos, e isso é muito agradável.
No concerto Na rota da dança oculta vamos
interpretar a peça Water Night, do compositor
norte-americano Eric Whitacre, com texto do grande
poeta Octavio Paz. Esse será um concerto-homenagem
ao centenário deste grande intelectual mexicano,
Prêmio Nobel de Literatura. Whitacre tem escrito uma
obra bela, muito difícil para um grande coro e para
nós é um desafio porque nós somos um coro de câmara.
Estou muito contente de que Leo me tenha pedido esta
peça".
"Whitacre tem realizado várias
composições corais sobre poemas de Octavio Paz, A
boy and a girl, Cloudburst, Little Birds e
Water Night".
"O título original do poema é
Agua Nocturna e uma de suas estrofes diz:
A noite de olhos de cavalo que
tremem na noite,
A noite de olhos de água no campo
dormido,
está em teus olhos de cavalo que
treme,
está em teus olhos de água secreta.
"Coralina também estará no concerto
O arco e a lira, outra homenagem a Paz, com
as interpretações de Rytmus, do compositor
Ivan Hrusovsky (1927-2001) Rytmus é um dos
três estudos do compositor eslovaco, de grande
interesse para os coros que desejem incluir peças
diferentes em seus repertórios, como é o caso de
Coralina".
"Além do mais, vamos fazer do
próprio Leo Brouwer suas Aleluyas criollas para
coro de voces blancas (I.O pequeno músico II. O
pequeno pregoeiro III. O pequeno filósofo) escrita
em 1965".
"Eu sempre adorei as três
Aleluyas criollas de Leo. Lembro-me quando a
maestrina Carmen Collado as cantava na época que eu
era estudante, na Escola Nacional de Arte e ela
regia o coro feminino Amadeo Roldán. Embora meu coro
não seja feminino as mulheres de Coralina vamos
fazer as três Aleluyas de Leo".
"Também vamos cantar com Haydée
Milanês, em seu concerto Palavras. Homenagem a Marta
Valdés, no ensejo do 80º aniversário de Marta. Vamos
interpretar Aida, dedicada a essa grande
figura dos quartetos cubanos com arranjos de
Haydée".
A compositora escreveu esta canção,
em 1973, dedicada a Aida Diestro (Havana 1924-1973),
pianista e diretora de coro, fundadora, em 1952, do
quarteto D’Aida, integrado por Elena Burke, Omara e
Haydée Portuondo e Moraima Secada.
A canção diz:
Aida, afinal de tudo o que falamos
viu,
A vida foi embora.
Aida, por trás do fumo, o sorriso
apesar de tanta pressa.
Aida, foi embora a lua da paisagem
Aida, mas você cantou a viagem toda.
Aida, compartilhando sempre a
harmonia.
Em seus 20 anos de trabalho, Schola
Cantorum Coralina recebeu inúmeros prêmios
internacionais, entre eles o Grande Prêmio
Cittád’Arezzo 2006, um dos mais importantes do
mundo; o do concurso de Habaneras e Polifonías de
Torrevieja, Espanha, 1999; o do concurso da Ilha
Margarita, Venezuela; concurso de Trelew, na
Patagônia argentina e em Miltemberg, Alemanha.
O coro também realizou digressões e
concertos por Suíça, França, Espanha, Itália,
Estados Unidos, Argentina, Chile, México, Venezuela,
Equador, Alemanha e Dinamarca e foi convidado para
cantar no Vaticano, como coro principal, na
Audiência Pública e na missa do Corpus Christi que o
papa oficiou, depois da vista de sua santidade João
Paulo II a Cuba.
Coralina teve imensa sorte com a
discografia, com títulos como Oh Magnum Mysterium,
com obras sacras de autores universais e também
latino-americanos e cubanos; Cánteme, canções
de Silvio Rodríguez, "visão de que as canções de
Silvio podem ser, e são, obras corais como qualquer
madrigal do século 16", Cantos da missa do papa
em Havana, 1998/JADE, França ou De que
cantada manera, 2003, textos do poeta nacional
cubano, Nicolás Guillén.
A Schola Cantorum Coralina ganhou
reconhecimento, devido ao seu elevado índice
profissional, mas também se diferencia por outras
características, entre elas, relevante sem dúvida, a
sensibilidade e entrega com que canta.
O Festival Leo Brouwer oferece agora
a possibilidade de escutar o amplo repertório deste
grande coro.